O Mecanismo do Desprazer e do Prazer na Sustentabilidade

Do ponto de vista psicanalítico, a mente humana desenvolve, a partir do nascimento, uma dialética entre a contínua insatisfação interna, as carências do existir (desprazer), em contraponto com os mecanismos de descarga parcial dessas tensões, chamado de prazer.

Isso ocorre a partir do nascimento porque é neste momento em que o indivíduo deixa um espaço de unidade e integralidade, vivido no útero da mãe, quando ele é o todo e o todo é ele (narcisismo primário), para adentrar ao espaço dialético da vida humana, quando surge o mundo exterior e suas privações.

Como esse mundo exterior castrará, isto é, limitará suas possibilidades de reviver a plenitude dos momentos intra-uterinos, isso será buscado durante toda a vida enquanto espaço das realizações humanas, as quais terão, então, o papel de descarga dessas tensões das carências do existir.

Todavia, a insatisfação, não é um mecanismo psicopatológico, ela tem sua função fisiológica de gerar o desejo, o querer, a pulsão de vida construtiva que dá sentido à vida. Assim, é o desejo a manifestação concreta da insatisfação, o caminho dinâmico para a superação do desprazer, a forma para se descarregar as tensões acumuladas, em um alvo querido ou objeto específico individualizado.

E aqui começa o problema da insustentabilidade do mundo atual. Insustentável porque a insatisfação humana é contínua e faz parte do sistema psíquico descarregar a tensão gerada para manter a estabilidade interna. Logo, um mecanismo ideal para a criação da sociedade de consumo, focada na geração de desejos infindáveis por produtos e serviços.

As técnicas de obsolescência programada surgiram para ampliar esse consumo, criando os desejos cada vez mais líquidos, para a descarga imediata das tensões, mas que abrem espaços de nova insatisfação no momento seguinte, para que novo consumo ocorra.

Desse modo, a matriz capitalista da sociedade de consumo mundial foca-se no contínuo ter efêmero, capaz de gerar cada vez mais lucros, em detrimento do uso indiscriminado de recursos naturais, o que torna insustentável o modelo humano de vida atual.

Uma mudança em prol da sustentabilidade implica na mudança do foco de descarga da insatisfação, deixando-se a busca pelo prazer do ter, pelo prazer do ser. Isto é, o uso do mecanismo de sublimação, com a canalização das forças dos desejos à produção de elementos imateriais enriquecedores da experiência humana, capazes de gerar intenso prazer na sua ocorrência.

A sublimação está no desejo e na vivência do afeto, da intelectualidade, da expressão artística, da espiritualidade, do esporte, da fraternidade, enquanto mecanismos efetivos de descarga das tensões internas, que produzem prazer na sua consecução e não geram, a priori, impactos ambientais consideráveis.

Entender esses mecanismos subjetivos é essencial para que cada qual possa avançar individualmente e coletivamente em prol da sustentabilidade. Como bem descreveu Freud: “decifra-me ou te devoro”.